Povo Pankararu [Pankararu People]
Aislan Pankararu: A afirmação de uma identidade por Bia Pankararu
Aislan Pankararu: A afirmação de uma identidade
Percorrer a obra de Aislan Pankararu é como percorrer a simbologia do sertão nordestino no seu ângulo mais singular. Pelas entranhas da Caatinga, por cada um dos seus galhos retorcidos, espinhentos ou floridos, chegamos numa representação visual da essência do povo sertanejo que foi, e seguirá sendo, INDÍGENA. Essa é uma essência ancestral.
O povo Pankararu, ao qual pertencemos, se situa no sertão de Pernambuco, mas na contramão da visão empobrecida e rasa sobre nossas diversidades, novas narrativas despertam para dizer que estamos aqui e podemos contar a nossa história, deixar nossas marcas no mundo e falar por nós. O conceito de arte sempre foi reservado à cultura da classe dominante e, a nós, foi atribuído o lugar de folclore. Fomos descritos e representados ao longo da história através de narrativas mitológicas, distantes, e desde a colonização fazem da nossa imagem o que bem entendem. O problema é que a branquitude ainda não nos entende.
Uma obra com a qual nos identificamos, que não só contemplamos, mas na qual nos enxergarmos em nosso íntimo, nos dando conta de como isso é belo e grandioso de uma forma jamais experimentada antes, mesmo com cada elemento pertencendo ao nosso dia-a-dia, à nossa tradição, à nossa memória. Em cada traço de Aislan posso ver o cansanção, o caminho que faço até a casa da minha avó e quando dancei a Corrida do Imbu pela primeira vez. Vejo juremeira, espinheiro, faveleira e macambira. O grafismo e simbologias de ritual que desaguam infinitamente, como ciclos perfeitos que rompem com a ideia do tempo. Dá pra ver o começo da vida numa raiz de árvore e a eternidade na sua semente, tal como nós, que temos o cordão umbilical preso numa raiz profunda e galhos espalhados para dar frutos, sementes, germinar e sermos o infinito. É mais que qualquer noção sobre arte, é uma noção de pertencimento. É saber exatamente onde nossa árvore primeva está plantada, é ter uma identidade visual que representa de mil e uma maneiras um mesmo povo, uma mesma região, um bioma e, dentro de cada especificidade, um universo para novas identificações.
Percebo que nossa atual geração, e dos povos indígenas no geral, está buscando uma identificação genuína em todos os campos das artes. Sinto essa identificação com a obra de Aislan Pankararu não só por sermos do mesmo povo, mas por saber que vários povos dessa região também se enxergam no traço de grafismo em branco, característico não só dos Pankararu, mas de toda uma corrente de povos que se interligam pelo mesmo cordão umbilical. Nossos heróis nunca foram príncipes ou imperadores, foram os que morreram defendendo seu povo. É tempo de termos os nossos próprios ídolos. Aislan segue criando mais que identificações – segue afirmando uma identidade. Aislan marca um ponto no tempo e espaço para uma nova era das artes visuais, e me sinto privilegiada em ver esse capítulo da história sendo escrito, em ser sua contemporânea e, também, sua fã.
Com amor e muita identificação,
Bia Pankararu